segunda-feira, 30 de abril de 2012

Baixada, blitz, documento!



Ewerson Cláudio de Azevedo 

A Baixada Fluminense tem uma identidade própria comum? Tudo indica que sim, afinal, é um fato a existência de características sociais, econômicas, políticas, culturais e geográficas, entre outras, semelhantes e próprias que nos habilitam a uma identificação única. 

Porém (ai, porém), a coisa não é tão simples assim. Identidade não é apenas a reunião de características comuns. Identidade implica em autorreconhecimento, em consciência de si, a velha e correta história do PARA SI e não apenas EM SI. 

Para além das complicações dos limites geográficos de uma região com 13 municípios (o que há de comum entre Paracambi e Magé ou Itaguaí e Gaupimirim?), há também questões a serem pensadas que dizem respeito a um suposto “miolo” da Baixada: Duque de Caxias, São João de Meriti, Nilópolis, Mesquita, Belford Roxo, Nova Iguaçu e Queimados. A população da Baixada se vê igual? Mais do que isso: as pessoas têm consciência disso e se interrelacionam enquanto iguais? Além da linha de ônibus Queimados-Caxias (que passa em seis dos sete municípios do “miolo”), a Baixada se liga – nos vários sentidos do termo – cotidianamente? 

A minha impressão é que não ou, pelo menos, muito pouco, muito aquém do necessário para nos orgulharmos de uma identidade própria. Até pela história de nossa formação social, vivemos bastante isolados uns dos outros. Afinal, a Baixada é filha da falta de planejamento do crescimento da metrópole. A partir da década de 50 e, principalmente na de 60, os pobres da periferia da Guanabara (menos os das favelas mais ao centro, que foram levados para a Cidade de Deus e Zona Oeste) e os que continuavam chegando do Nordeste e do interior do Sudeste, foram jogados nos municípios mais pertos do antigo estado do Rio de Janeiro. Este que vos escreve, por exemplo, é filho de capixabas, nasceu em 1962 em Santa Tereza, morou em Bento Ribeiro e desde 1969 habita pelas bandas de Mesquita/Nova Iguaçu. 

Assim, em parcerias, digo, ação entre amigos dos poderes públicos com donos de loteamentos, foram aparecendo bairros sem rede de esgotos, abastecimento d’água ou iluminação pública. Com a explosão do crescimento demográfico desses lugares, multiplicaram-se os problemas: trânsito e transporte ruins, redes públicas de saúde e educação precárias e insuficientes, ausência de aparelhos e política culturais etc. Isso tudo contribui para o “exílio em si mesmo” de cada município e até de cada bairro. 

Além disso, a capital, pelo poderio econômico, possui uma força gravitacional desproporcional. Cada município da Baixada é atraído diretamente para a órbita do Rio e, em sua rota de satélite, não vê e nem interage com o seu vizinho. É claro que há inúmeras iniciativas, em especial na sociedade civil organizada, de re-união da Baixada, mas o que estou dizendo é que isso ainda é insuficiente e não é um movimento espontâneo dos indivíduos da região. Além do mais, disputas do tipo “quem é a capital da Baixada, Caxias ou Nova Iguaçu?” – que indiretamente reproduz a relação Império-Colônia que o Rio tem conosco – só fortalece o isolamento e a divisão tão propícios para o Reino. 

Concluindo, acho que a Baixada precisa de mais iniciativas de autorreconhecimento e de incentivo a reflexões e ações conjuntas. A Rede de Cultura organizada pela FASE, o Fórum Reage Baixada que pretende promover atividades permanentes e a comemoração do Dia da Baixada, entre outros, são ações importantes que devem ser elogiadas e fortalecidas. A caminhada só está começando. No futuro, quem sabe, não correremos o risco de sermos pegos desprevenidos quando a sociedade gritar: “Baixada, blitz, documento!”. Teremos os instrumentos. 

(publicado originalmente em 19.04.2007)

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